domingo, 11 de março de 2012

Existia na prateleira de cima um Atlas Universal da Linguagem que se diz escrito antes da Torre de Babel cair por terra. Encostei a mesinha á prateleira, fui buscar um banco e pu-lo em cima da mesinha, e depois, pus-me em bicos de pés em cima do banco, em cima da mesinha. Consegui a muito custo pegar neste pequeno tesouro e desci. Sentei-me no chão e folheei-o. Assim, sem me dar conta, passaram-se horas e horas, dias, semanas, tempos sem fim, em que não fiz outra coisa. Queria aprender os segredos da linguagem, aprender as palavras que traduzem este nó que se instala na garganta e me rouba a respiração. Queria aprender a dizer uma linguagem transcendente. Aprender a dizer este enxame de abelhas e vendaval. E li. Pus-me a ler sem fim. Aprendi a dizer 'maçã' e 'trincar', aprendi a dizer 'labirinto', 'esperar', 'agarrar', 'azul' ou 'cetim', aprendi inclusive a dizer 'meu' e 'teu' e 'palpitar' mas este nó permanece, e não há palavras que o 'digam', que o 'traduzam'. Os puristas rapidamente responderiam 'Poesia', mas, tempos sem fim, disse eu, a tentar aprender traduzir verbalmente uma coisa que não se traduz por palavras.














tocar-te os lábios.


Um comentário:

je suis...noir disse...

" eu venho sem idiomas desde a minha solidão e sem idiomas vou até à tua"
(Luis García Montero)